![]() Hebiatria ou Hebeatria? |
![]() Cérebro-fácio-torácica ou cerebrofaciotorácica? |
![]() Efeito placebo ou Efeito-placebo? |
---|
Índice
Miscelânea
Português
Isto ou Aquilo?
Cérebro-fácio-torácica ou cerebrofaciotorácica?
"
Melhor forma: síndrome cerebrofaciotorácica.
As formas cérebro, facio e toraco são afixos. São componentes vocabulares eruditos. Com a terminação -ico(a), formam um adjetivo composto: cerebrofaciotorácico(a).
Facio não é outra coisa senão um elemento de composição, pois não existe palavra autônoma que se escreve como “facio”. Observa-se que esse elemento é de formação controversa, pois procede do latim facies e deveria ser faci-, como em facial, ou face-, como em facear e faceamento. Os elementos prefixais procedentes do latim, de regra, terminam em “i”, e se do grego, em “o”. Toraco também se enquadra no mesmo fenômeno.
Como elemento de composição, usa-se o afixo cerebro-, cujo acento subtônico permanece na sílaba “ce”, mas pode portar o acento acrítico em casos especiais como em cérebro-hipofisário, em que cérebro- é um elemento de composição, não um substantivo.
Por terem acentuado sentido de termo autônomo, com significação delimitada que impressiona a consciência de quem lê, escuta ou fala, muitos dos elementos de composição que indicam estrutura orgânica não são prefixos verdadeiros, como ensina Herculano de Carvalho (Teoria da linguagem, 1974, p. 554), mas elementos de composição que assumem o sentido global do vocábulo.
Cérebro é um substantivo e sabe-se o que significa. Mas no termo cerebrofaciotorácico, cerebro deixa de ser substantivo, não tem o sentido que tem como substantivo, e passa a constituir elemento de composição vocabular e tem função prefixal no caso e, com facio, toraco e a terminação -ico designativa de adjetivo, forma um termo composto, um adjetivo, de sentido único. “A palavra composta representa sempre uma idéia única e autônoma, muitas vezes dissociada das noções expressas pelos seus componentes” (C. Cunha & L. Cintra, Gram. do port. contemporâneo, 1998, p. 104). Como prefixo, cerebro passa de substantivo para função adjetiva restritiva ao substantivo a que o vocábulo, do qual é componente, se refere. deformação cerebrotorácica, conexão cerebrotorácica.
A composição cérebro-fácio-torácica forma termo irregular por despadronização gramatical com mistura inadequada de substantivo, afixo e adjetivo, e é contrária às normas gramaticais e ortográficas oficiais, estas contidas por lei no Vocabulário Ortográfico da Academia Brasileira de Letras, em que esses elementos de composição estão registrados sem ligação com hífen. Isso torna seu uso problemático em relatos formais, principalmente os científicos, atitude que não poderia ser recomendável, pois os profissionais dessa área são especialistas em linguagem, oficialmente reconhecidos e diplomados. A nossa formação médica não inclui essa área na grade curricular. Cabe aos médicos determinar a utilidade e a utilização de seus termos, mas o estabelecimento da forma vocabular está por profissionais dessa área. Desse modo, é recomendável o parecer do especialista formado em linguagem e gramática para que o médico possa criar a forma adequada de um vocábulo de sua área, assim como recorremos ao especialista em estatística para usarmos os cálculos adequados, ao nutricionista para a alimentação especial, ao psicólogo para a conduta apropriada em distúrbios de comportamento.
Se o autor desejar destaque especial para cada termo, neste caso em questão, poderia usar os termos separados como adjetivos. Poderia escrever síndrome de envolvimento cerebral, facial e torácico, síndrome cerebral, facial e torácica ou até síndrome cerebral-facial-torácica.
Se escrevemos lesão gastroduodenocoledocopancreática, o leitor poderá discernir bem o significado. É esse o uso normal em castelhano e em alemão por exemplo. Se for lesão gástrica, duodenal, coledociana e pancreática o destaque, sem dúvida, ficará melhor e gramaticalmente também adequado. Se quiser dar destaque a um dos nomes poderia usar letras itálicas, sublinhar, usar negrito e outras formas. A múltipla interseção de um nome por meio de hifenização pode interferir com a unidade vocabular e formar uma seriação de termos ligados por hífen. A função dos afixos é formar um vocábulo composto, essencialmente formar uma só palavra. É o que está nas gramáticas. Em nenhuma delas pude encontrar um enunciado em que os afixos podem, por exemplo, ser separados por hífen como forma de destaque de seus termos.
Entretanto, escrever formas hifenizadas não é considerado erro por bons lingüistas, pois se existem na língua, constituem riqueza do idioma. De fato, existem muitas formas hifenizadas no idioma e tomadas como padrão até oficial, tendo em vista, principalmente, a consagração do uso. É o que ocorre com greco-romano, ultra-som, neo-uretra, garrincha-do-mato-virgem.
Mas é preciso considerar que, quando se escreve um mesmo termo de formas diferentes, configura-se despadronização. Por outro lado, não é indicado adotar exceções em lugar das regras para formar uma palavra científica. Por exemplo, se todos escrevessem cárdio-vascular, seria esta a forma ortográfica de padrão, mas se houver cárdio vascular, cárdio-vascular e cardiovascular, a organização da ortografia ficaria questionada. De fato, como padrão, o leitor verá apenas cardiovascular (sem hífen) nos dicionários de referência maior, como o Houaiss, o VOLP, o Unesp, o Aurélio, o Michaelis, e lerá nas gramáticas que o afixo cardio é usado sem hifen. Essa é a regra. A orientação da Academia Brasileira de Letras é de suprimir os hífens e registra, por exemplo, gastroentereanastomose. Registra também oftalmotorrinolaringologista, um nome que aglutina estruturas distintas, mas formam sentido único porque indica a denominação de um profissional.
Em conclusão, do ponto de vista lingüístico, em que se observa o idioma como um todo, com tudo que nele existe, sem formar regras, não está em erro escrever síndrome cérebro-fácio-torácica. Mas, do ponto de vista gramatical normativo, é formação controversa e esse termo poderá mais provavelmente ser um dia dicionarizado como cerebrofaciotorácico. Recomenda-se, assim, em relatos científicos formais, usar síndrome cerebrofaciotorácica como nome mais conforme à índole da gramática e da ortografia oficial.
Tendo em vista essas questões, diante de dúvidas e do acolhimento de formas que possam criar questionamentos, é recomendável voltar-se a consultores autorizados da ABL e de outros institutos de idioma de nível universitário.
Simônides Bacelar
![]() Hebiatria ou Hebeatria? |
![]() ![]() ![]() ![]() Cérebro-fácio-torácica ou cerebrofaciotorácica? |
![]() Efeito placebo ou Efeito-placebo? |
---|
10683
dias on-line ![]() ![]() |
Idealização, Programação e Manutenção: Prof. Doutor Malthus Fonseca Galvão
http://lattes.cnpq.br/3546952790908357
|