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O adágio latino hipocrático
“primo non nocere”,
nos transmite: PRIMEIRO NÃO PREJUDICAR. Por sua vez, a responsabilidade civil
também tem o seu aforismo latino “naeminen laedere”, que nos faz entender
ser necessário NÃO LESAR NINGUÉM. Medicina vem do grego: “medeor” –
aquele que cuida. É fácil entender que aquele que cuida não prejudica, não lesa
ninguém, e demonstra isto uma convergência de objetivos do atuar do médico com a
mensagem que transmite o conceito de responsabilidade civil. Ao
conceituar responsabilidade civil, Pontes de Miranda nos diz:
“Quando fazemos o que não temos o direito de
fazer, certo é que cometemos ato lesivo, pois que diminuímos, contra a vontade
de alguém, o ativo dos seus direitos, ou lhe elevamos o passivo das obrigações,
o que é genericamente o mesmo.” (TRATADO DE DIREITO PRIVADO, Tomo LIII, 2.
ed. Rio de Janeiro: Borsoi, 1966, p.13). O que é complementado pela definição de
Maria Helena Diniz : “A responsabilidade civil é a aplicação de medidas que
obriguem uma pessoa a reparar dano moral ou patrimonial causado a
terceiros, em razão de ato por ela mesma praticado, por pessoa por quem ela
responde, por alguma coisa a ela pertencente ou de simples imposição legal.”
(CURSO DE DIREITO CIVIL
BRASILEIRO. RESPONSABILIDADE CIVIL. 10. ed., São Paulo: Saraiva, 1996, v. 7,
p.29). Assim, se o Cirurgião Plástico na sua atividade causar dano a outrem
– paciente – fica evidenciada a sua conduta antagônica aos princípios da
medicina e da responsabilidade civil. Havendo prejuízo para o paciente em
decorrência de uma cirurgia plástica surge para a pessoa física ou jurídica,
prestadora do serviço, o dever de reparar o dano que causou a este. Como bem
analisa Hans Kelsen: “Quer dizer: ele não só é obrigado a não causar a
outrem qualquer prejuízo com a sua conduta mas ainda, no caso de, com essa sua
conduta, ter causado um prejuízo a outrem, a indenizar esse prejuízo.”
(TEORIA PURA DO DIREITO. 6. ed., São Paulo: Livraria Martins Fontes Editora,
1998, p. 139). Há necessidade de
ressarcimento de dois tipos de dano: o patrimonial e o moral. O Código Civil
brasileiro refere-se, em seu artigo 389, às perdas e danos que nada mais são que
os prejuízos decorrentes, para o paciente, do erro do cirurgião plástico. O
Código Civil pátrio, abrange, em seu artigo 186, tanto os danos materiais (lesão
aos direitos reais e pessoais), como os danos morais (direitos da personalidade
e da família). Nesses, danos morais, está incluído, como espécie, o dano
estético. Se qualquer destes danos ocorre, por erro do cirurgião plástico, há
necessidade de averiguar-se qual a repercussão econômica negativa que causaram
ao paciente – vítima do mesmo. A
Súmula 37, do STJ – Superior Tribunal de Justiça, verbis:
“São cumuláveis as indenizações por dano material e dano moral
oriundos do mesmo fato.”, já determinou que ambos os danos, material e
moral, podem ter valores pecuniários atribuídos autonomamente na sentença
judicial. O dano estético, apesar de ainda não ser tema sumulado, tem
entendimento no STJ de que pode, na sentença, ser atribuído cumulativamente
(independentemente) com o dano moral (do qual é espécie) e o dano material. A
responsabilidade civil do cirurgião plástico, como ocorre com a responsabilidade
civil, em geral, no Brasil, tem fulcro, entre outros, no
artigo 186 do Código Civil Brasileiro, verbis:
“Aquele que por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência,
violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete
ato ilícito.”, bem como no artigo 951, do mesmo Código, que diz:
“O disposto nos arts. 948, 949 e 950 aplica-se ainda no caso de
indenização devida por aquele que, no exercício de atividade profissional, por
negligência, imprudência ou imperícia, causar a morte do paciente, agravar-lhe o
mal, causar-lhe lesão, ou inabilitá-lo para o trabalho.”.
Se estabelece uma relação
contratual, como ocorre com todos os médicos, entre o cirurgião plástico e o
paciente, como nos ensina René Savatier:
“Entre le médecin et le malade,
intervient un contrat.
Du contenu de ce
contrat, dépend la responsabilité de l`un envers l`autre; il s`agit donc d`une
responsabilité contractuelle. Après avoir paru longtemps décider le contraire,
la Cour de cassation a reconnu ce principe. Et les tribunaux et cours d’appel
sont maintenant unanimes à l’affirmer.”,
(TRAITÉ DE LA RESPONSABILITÉ CIVILE EN DROIT FRANÇAIS.
2. ed., Paris: Librairie Générale
de Droit et de Jurisprudence, 1951, Tomo II, p. 375-376) o que, em tradução do
autor, nos transmite esta mensagem: “Entre o médico e o paciente estabelece-se
um contrato. Do conteúdo desse contrato, depende a responsabilidade de um frente
ao outro; se apresenta portanto como uma responsabilidade contratual. Após muito
tempo decidindo o contrário, a Corte de cassação reconheceu esse princípio. E os
tribunais e cortes de apelação são também unânimes em confirmá-lo.”.
A Cirurgia Plástica pode ser:
ESTÉTICA (embelezadora) e RESTAURADORA (acidentes, violências e defeitos
congênitos). A Cirurgia Plástica ESTÉTICA, se caracteriza por, neste contrato, o
médico se comprometer com uma obrigação de resultado; é assim que pensam
a doutrina e jurisprudência brasileiras, majoritariamente, apesar de vozes em
contrário. Na Cirurgia Plástica REPARADORA, o compromisso do cirurgião plástico
com o paciente se dá através de uma obrigação de meios.
No que se refere à atividade do médico cirurgião
plástico, é, pois, predominante, na doutrina e jurisprudência, o entendimento de
que esse ao executar cirurgias plásticas estéticas - embelezadoras, está
assumindo uma obrigação de resultado. Indiscutivelmente, em nosso país, na
cirurgia plástica estética (e não na cirurgia plástica reparadora), verifica-se
haver aceitação generalizada de, pela não - efetivação do resultado, inverter-se
o ônus da prova – característica esta, doutrinária, da obrigação de resultado.
Neste sentido vai Jerônimo Romanello Neto:
“É pacífico na doutrina que a obrigação do médico na cirurgia plástica
estética é de resultado e não de meio. Por tal razão inverte-se, dessa maneira o
ônus da prova, ficando a encargo do médico a prova liberatória de que não
laborou com imprudência, negligência ou imperícia, para não ser responsabilizado
pelo dano ou prejuízo que causar.” (RESPONSABILIDADE CIVIL DOS MÉDICOS, São
Paulo: Editora Jurídica Brasileira, 1998, p.133). Mas, sempre houve
recomendações no sentido de que havia necessidade de se ater aos dados do caso
concreto como no escólio de Julio Cezar Meirelles Gomes e Genival Veloso de
França: “Hoje mesmo em especialidades antes
consideradas como de obrigação de resultado, como cirurgia puramente estética,
já se olha com reserva o conceito radical de êxito absoluto, pois o mais correto
é sempre se guiar pelas circunstâncias de cada caso.” (ERRO
MÉDICO - Um Enfoque Sobre Sua Origem E Suas Conseqüências, colaboração de José
Geraldo de Freitas Drumond, Montes Claros – MG: Editora Unimontes, 1999,
p.145-46).
Em caso de responsabilização por
falha contratual do cirurgião plástico é a responsabilidade subjetiva (teoria
da culpa) deste a que vem expressa no § 4°, do art.14, da Lei n° 8.078/90,
Código de Proteção e Defesa do Consumidor - CDC. A relação contratual, na
relação de consumo do serviço médico fornecido pelo profissional liberal, se
estabelece por obrigação de meios ou de resultado. Quando se tratar de uma
obrigação de meios, em face de uma avaliação jurídica de erro médico, cabe ao
paciente a comprovação da culpa do profissional médico. No caso de estarmos
frente a uma obrigação de resultado, o que ocorre com a obrigação assumida pelo
cirurgião plástico, ainda se trata de responsabilidade subjetiva mas a
responsabilização do profissional médico, no caso o cirurgião plástico, em
juízo, acontece com a inversão do ônus da prova.
Na OBRIGAÇÃO DE MEIOS, o
contratado se obriga a utilizar os meios adequados para realizar sua tarefa – o
comportamento do profissional, tecnicamente falando, o agir propriamente dito, é
que é englobado na relação jurídica - cumprindo com a obrigação aquele que se
obrigou se, na relação profissional que se processou, comportou-se de maneira
adequada, compatível com o que foi contratado. Ou seja, agiu com diligência,
prudência e perícia – técnica adequada ao “estado da arte” naquele determinado
local e momento. Não há o compromisso de curar, mas de atuar em conformidade com
as regras e os métodos da profissão. Deve envidar todos os esforços para
alcançar a cura do paciente. Assim fazendo cumpriu a sua obrigação contratual.
Na OBRIGAÇÃO DE RESULTADO, o
compromisso é de realizar um determinado ato com o paciente para obter um
resultado preciso. Nessa obrigação, dentro da relação jurídica, se encontra a
necessidade de obter um resultado específico, determinado, sendo esse devido
pelo obrigado – o cirurgião plástico - ao paciente que o contratou. Só estará
cumprida a obrigação contratual se alcançar aquele resultado especificamente
contratado. A obrigação de resultado ocasiona, por comando doutrinário, quando
em juízo, a determinação de inversão do ônus da prova.
Sendo a obrigação do Cirurgião
Plástico uma obrigação de resultado a inversão processual do ônus da prova,
previsão esta também expressa, como possível, pelo inciso VIII, do artigo 6º, do
CDC (“ Art. 6º. São direitos básicos do consumidor: (...)
VIII - a facilitação da defesa de
seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no
processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando
for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências;”),
tende a ser rotineira nos casos jurídicos nos tribunais, quando da avaliação
pelos mesmos de erro médico ocorrido no terreno da Cirurgia Plástica, pois ela
já é, doutrinariamente, declarada como indicada. A inversão do ônus da prova,
repita-se, é, pois, inerente, processualmente falando, por orientação
doutrinária, aos casos judiciais de erro médico em que o objeto do contrato é
uma obrigação de resultado, e isto ocorre, em caso de erro médico, na cirurgia
plástica estética (embelezadora). O mesmo CDC,
no parágrafo 4º, do seu artigo 14, estabelece “- A responsabilidade
pessoal dos profissionais liberais será apurada mediante a verificação de culpa.”,
e, o cirurgião plástico, apesar da inversão do ônus da prova, incumbindo-se a
contento da tarefa de comprovar nos autos que não agiu com negligência,
imperícia ou imprudência, ou seja, que o dano ao paciente não existiu ou não foi
causado pelo seu agir culposo, exime-se da responsabilização civil que lhe é
imputada pelo paciente. Apesar da sua obrigação ser de resultado, a
responsabilidade do cirurgião plástico continua a ser nos termos da
responsabilidade subjetiva (teoria da culpa) – cabe a ele demonstrar em juízo
que o seu agir não foi culposo. Deve demonstrar que se houve dano outra foi a
sua causa, que não o seu agir por imprudência, imperícia ou negligência.
É, pois, o erro do cirurgião plástico um
inadimplemento, bem definido, de um contrato. Contratualmente falando, trata-se
de uma conduta bem caracterizada de falha na prestação de serviço médico,
enquadrando-se na abrangência do campo da responsabilidade contratual, gerando
uma obrigação de indenizar o lesado (aquele paciente que teve o seu direito
violado). Como comanda o Código Civil brasileiro, em seu artigo 389, verbis:
“Não cumprida a
obrigação, responde o devedor por perdas e danos, mais juros e atualização
monetária segundo índices oficiais regularmente estabelecidos e honorários do
advogado.”.
Para comprovação do erro no
atendimento do cirurgião plástico, usam-se todos os meios probatórios em direito
aceitos. Em particular, também no caso da atividade de cirurgia plástica
estética, os prontuários e fichas de anotações clínicas com dados dos pacientes,
ressaltando-se a importância, pela complexidade e controvérsias do agir nos
tratamentos realizados, da prova pericial que pode, até, tornar-se
indispensável.
Em cirurgia plástica, aceita como
relação contratual com obrigação de resultado, o paciente não tem a tarefa de
provar a culpa do médico, mesmo se tratando de um profissional liberal, onde
seria exigível, em tese, a comprovação de culpa no agir do profissional. Cabe ao
paciente, no caso de cirurgia plástica estética provar somente a omissão ou ação
do médico e o dano e o nexo causal entre estes. Inverte-se o ônus da prova, ou
seja, cabe ao cirurgião plástico provar, em juízo, que agiu sem culpa. Pode,
nesta ocasião, o cirurgião plástico, argüir defesas, excludentes da
responsabilidade civil, como as previstas no § 3°, do artigo 14, da Lei
8.078/90 - Código de Proteção e Defesa do Consumidor (“– O fornecedor de
serviços só não será responsabilizado quando provar: I – que, tendo prestado o
serviço, o defeito inexiste; II – a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.”)
e no, caput, do artigo 393, do Código Civil brasileiro (“O
devedor não responde pelos prejuízos resultantes de caso fortuito ou força
maior, se expressamente não se houver por eles responsabilizado.”).
Frise-se, pois, que há inversão do ônus da prova do cirurgião plástico, por
comprometer-se este com o paciente através de uma obrigação de resultado,
cabendo, assim, ao cirurgião plástico fazer a prova em contrário, podendo ser
elidida a sua culpa com a comprovação de uma causa diversa para o resultado, que
não o seu ato médico. Exoneram da responsabilidade civil, em caso de dano ao
paciente, a FORÇA MAIOR ou o CASO FORTUITO (artigo 393, do Código Civil
brasileiro). Não há, em qualquer instante, a atuação culposa do cirurgião
plástico, tanto no caso fortuito, como na força maior. Há exoneração da
responsabilidade civil do cirurgião plástico se a lesão ao paciente é
decorrente de caso fortuito ou força maior.
A força maior considera-se um fato
natural, superior às forças humanas, não sendo possível ao ser humano evitar sua
ação e conseqüências, apesar de identificada e previsível. Não se resiste a ele
mesmo que se queira. Portanto, a força maior se caracteriza por ser um evento
externo à relação cirurgião plástico e paciente.
O caso fortuito é aquele fato que
decorre da conduta humana, tendo como característica não poder ser previsto e
evitado pelos participantes da relação: profissional e paciente. Assim,
independe a sua ocorrência tanto do cirurgião plástico, como do paciente. É
obra do acaso – não esperado na conjuntura do que está ocorrendo em um
determinado momento.
A responsabilização na área da
justiça civil atingirá a todos que de uma maneira ou outra estejam vinculados ao
prejuízo – todos que sejam responsáveis pelo dano causado ao paciente. Como
comanda, em seu caput, o artigo 942, do Código Civil brasileiro,
verbis: “Os bens do responsável
pela ofensa ou violação do direito de outrem ficam sujeitos à reparação do dano
causado; e, se a ofensa tiver mais de um autor, todos responderão solidariamente
pela reparação.”. Esta
responsabilidade civil se estende, inclusive, às pessoas jurídicas prestadoras
de serviços médicos em Cirurgia Plástica, pois diz o parágrafo 6°, do artigo 37,
da Constituição Federal brasileira: “As pessoas jurídicas de direito público
e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos
que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito
de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.”. Os serviços
de saúde públicos e os serviços de saúde privados (serviço público delegado às
entidades privadas) responderão, pois, em termos de responsabilidade civil,
pelos danos sofridos por pacientes submetidos a procedimentos médicos nos seus
serviços especializados em Cirurgia Plástica. E, por isto, em tudo estão
submetidos à regra que vem esculpida no artigo 932, do Código Civil pátrio, em
seu caput e inciso III, que diz: “São também responsáveis pela
reparação civil:
(...)
III – o empregador ou comitente, por seus
empregados, serviçais e prepostos, no exercício do trabalho que lhes competir,
ou em razão dele;”.
E, a Súmula 341, do STF – Supremo Tribunal Federal, se encarrega de explicar
que: “É presumida a
culpa do patrão ou comitente pelo ato culposo do empregado ou preposto.”.
Há julgados que estatuem serem o médico que integra o corpo clínico do hospital
e a pessoa física ou jurídica que mantém esta empresa de saúde, respectivamente,
preposto e preponente, mesmo não havendo entre eles vínculo empregatício. Alguém
prestar serviços sob as ordens de outro ou em evidente dependência funcional
(técnica ou administrativa) seria suficiente para caracterizar a relação de
preposição. Isto traz como conseqüência que respondam, em juízo, de forma
solidária pelos danos causados aos pacientes. No que se refere aos seus
auxiliares, de qualquer nível, o cirurgião plástico responde pelos atos dos
mesmos dentro da doutrina da responsabilidade civil, devido à responsabilidade “in
eligendo” (responsabilidade civil, ao eleger os seus auxiliares, pela
conduta defeituosa dos mesmos no desempenho de suas atividades, tanto do ponto
de vista técnico como moral) e “in vigilando” (responsabilidade civil nos
mesmos aspectos referidos, mas no que tange à vigilância – fiscalização – da sua
correta atuação no atendimento aos pacientes).
O cirurgião plástico no exercício
de sua atividade pode ser responsabilizado judicialmente por danos causados por
equipamentos, materiais e substâncias que venha a utilizar no paciente. Fica,
nestes casos, caracterizada a responsabilidade civil do cirurgião plástico pelo
fato da coisa. Se ocorrer um dano ao paciente
decorrente do uso dos equipamentos que utiliza este arcará com a
responsabilidade civil. A utilização do objeto confunde-se com a tarefa
executada pelo cirurgião plástico no exercício da sua atividade.
Em relação aos produtos farmacêuticos
(substâncias, materiais, medicamentos) deve observar a recomendação do
fabricante e ajustá-los ao paciente.
Em nosso Código Civil a responsabilidade civil
pelo fato da coisa vem regrada no artigo 938: “Aquele que habitar prédio, ou
parte dele, responde pelo dano proveniente das coisas que dele caírem ou forem
lançadas em lugar indevido.”, sendo esta a norma à qual o julgador subsume a
conduta do cirurgião plástico em casos em que algum equipamento, material,
substância, ou mesmo medicação, cause um dano ao paciente submetido a um
procedimento em Cirurgia Plástica.
A teor do artigo 429, do Código de
Processo Civil brasileiro, verbis: “Para o desempenho de sua função,
podem o perito e os assistentes técnicos utilizar-se de todos os meios
necessários, ouvindo testemunhas, obtendo informações, solicitando documentos
que estejam em poder de parte ou em repartições públicas, bem como instruir o
laudo com plantas, desenhos, fotografias e outras quaisquer peças.”, cuja
correta exegese permite afirmar que o perito judicial, bem como os
assistentes técnicos de ambas as partes, ao executarem as suas atribuições,
estão autorizados, a perseguirem as evidências técnicas para executarem a
contento as suas atribuições na função processual que lhes foi conferida. Para
isto devem fazer uso de qualquer tipo de prova, admitida em Direito, para
atingirem seu objetivo técnico. O direito de provar vem amparado pelos
princípios constitucionais do contraditório e da ampla defesa (inciso LV, do
artigo 5º, da Constituição Federal brasileira: “- aos litigantes, em processo
judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o
contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes;).
Para tanto o autor - paciente - da ação pode ter requerida a sua avaliação
clínica no processo, e algum outro exame médico complementar que se faça
necessário ao conjunto probatório, como parte integrante da perícia judicial,
nos casos de análise judicial de erro médico em Cirurgia Plástica, para
aquilatar as reais seqüelas com as quais permaneceu e suas verdadeiras e
definitivas repercussões em seu organismo. Para tanto, inclusive, pode-se
utilizar, em juízo, o que determina o Código de Processo Civil pátrio, em seu
artigo 431-B (incluído pela Lei nº10.358, de 27 de dezembro de 2001),
verbis: “Tratando-se de perícia complexa, que abranja mais de uma área
de conhecimento especializado, o juiz poderá nomear mais de um perito e a parte
indicar mais de um assistente técnico.”, ampliando, assim através da
multidisciplinaridade dos profissionais que atuem na perícia judicial, a
profundidade da avaliação da real situação dos danos porventura sofridos pelo
paciente e a sua relação de causa e efeito – nexo causal - com o ato médico do
cirurgião plástico (o agente lesante).
Os danos causados ao paciente
podem, até, serem causados por motivos que fogem ao controle – independem - do
cirurgião plástico, mas se este não informou corretamente, ao paciente, da
possibilidade de sua ocorrência, poderá, no terreno da responsabilidade civil,
ser responsabilizado judicialmente pelos mesmos. Para ilustrar esta realidade
valemo-nos do escólio de José de Aguiar Dias:
“Decompondo
as obrigações implícitas no contrato médico, verificamos que ele impõe aos
médicos estes deveres: 1) conselhos; 2) cuidados; 3) abstenção de abuso ou
desvio de poder.” (DA RESPONSABILIDADE
CIVIL. 10. ed., V. 1, Rio de Janeiro: Editora Forense, 1995, p.256). E, este
dever de “conselhos”, vem a ser a elaboração de um Consentimento
Informado adequado ao procedimento em Cirurgia Plástica que vai ser realizado.
Como nos ensina Hildegard Taggesell Giostri: “Consentimento informado,
conforme se pode extrair do entendimento americano, é o diálogo entre o paciente
e o provedor de serviço, por intermédio do qual ambas as partes trocam perguntas
e informações, culminando com o acordo expresso do paciente para a intervenção
cirúrgica, ou para um determinado e específico tratamento.”
(RESPONSABILIDADE MÉDICA – As obrigações de meio e de resultado: avaliação, uso
e adequação. Curitiba: Editora Juruá, 2003, p.83). E, a mesma autora, nos diz
mais: “Se no atendimento clínico e no âmbito da cirurgia geral isso se faz
necessário, há determinadas especialidades (verbi gratia, a cirurgia plástica,
dita estética), nas quais o nível de informação deve ser, ainda mais amplo e
abrangente.” (ERRO MÉDICO – À luz da jurisprudência comentada. 2. ed.,
Curitiba: Editora Juruá, 2004, p.121).
No mesmo sentido vai Rui Stoco: “Na
cirurgia, porém, especialmente na estética, a informação deve ser completa e
exaustiva, inclusive quanto ao uso de novos medicamentos ou novas técnicas
cirúrgicas.” (RESPONSABILIDADE
CIVIL E SUA INTERPRETAÇÃO JURISPRUDENCIAL 4. ed., São Paulo: Editora Revista dos
Tribunais, 1999, p. 287). Assim, destes ensinamentos auferimos que o bom para um
paciente é o que emergir de uma decisão baseada na inter-relação entre as mais
atuais técnicas da medicina, as habilidades de competentes especialistas, e a
sua escala de valores de vida. Porém, não há que se dizer haver uma decisão
consciente e voluntária quando a vontade estiver impregnada de vícios, tais como
ignorância, erro ou coação. Estando presente a
ignorância, no decidir do
paciente, há ausência de conhecimentos sobre o objeto desta decisão. Enquanto no
erro, há noção equivocada – falaciosa - sobre um fato ou coisa específicos. O
consentimento pode ser inválido por haver nele a presença de um erro
substancial, ou seja, uma viciada declaração de vontade por falsa noção sobre as
reais características da terapêutica (ato médico) ou da enfermidade. E não
faltam comandos legais no sentido de que o paciente seja convenientemente
informado. Veja-se o Código de Ética Médica (Resolução CFM – Conselho federal de
Medicina, nº1.246, de 8 de janeiro de 1988), que em seu Capítulo IV, DOS
DIREITOS HUMANOS, diz no artigo 46: “É
vedado ao médico:
Art. 46 – Efetuar qualquer
procedimento médico sem o esclarecimento e o consentimento prévios do paciente
ou de seu responsável legal, salvo em iminente perigo de vida.”,
e no artigo 48: “É vedado ao médico: Art. 48 – Exercer sua autoridade de
maneira a limitar o direito do paciente de decidir livremente sobre a sua pessoa
ou bem-estar.”. Ainda o Código de Ética Médica, diz em seu Capítulo V,
RELAÇÃO COM PACIENTES E FAMILIARES, no artigo 56: “É vedado ao médico:
Art. 56 – Desrespeitar o
direito do paciente de decidir livremente sobre a execução de práticas
diagnósticas ou terapêuticas, salvo em caso de iminente perigo de vida.”
E no artigo 59: “É vedado ao médico: Art. 59 – Deixar de informar ao
paciente o diagnóstico, o prognóstico, os riscos e objetivos do tratamento,
salvo quando a comunicação direta ao mesmo possa provocar-lhe dano, devendo,
nesse caso, a comunicação ser feita ao seu responsável legal.”, deixando bem
clara a imposição ética ao médico do dever de bem informar ao paciente.
Sobre o mesmo tema, por didático, cabe transcrever a manifestação da Assessoria
Jurídica do Conselho Federal de Medicina no
PARECER-CONSULTA CFM Nº 3.528/94 PC/CFM/Nº
24/97, que teve por Relator o Conselheiro Sérgio Ibiapina Ferreira Costa: “A
Assessoria Jurídica do CFM, ao manifestar-se sobre a matéria, enfatizou
os seguintes pontos: 1
- O médico tem o dever de informar o paciente acerca dos riscos do ato médico e
das conseqüências dos medicamentos que forem prescritos; 2
- Além disso, o médico tem responsabilidade civil, penal e disciplinar sobre
seus atos, devendo essa responsabilidade ser avaliada em cada caso; 3
- O chamado "termo de consentimento esclarecido" tem como finalidade
"formalizar" ou "documentar" o médico e, também, o paciente sobre as
conseqüências que poderão advir do ato médico e da prescrição de medicamentos,
inclusive hipóteses de caso "fortuito" e "força maior" desconhecidas da
"Ciência" e que escapam ao controle da Medicina. Dessa forma, o aludido termo ou
autorização não tem a virtude de excluir a responsabilidade do médico. Não pode
ser entendido, pois, como excludente de responsabilidade ou cláusula de
não-indenização. 4
- O aludido "documento" cumpre finalidade ético-jurídica e pode ser apreciado
como "prova" da lisura do procedimento médico;
5 - Assim, o "termo de consentimento
esclarecido" jamais deverá ser de cunho impositivo, devendo ser sempre grafado
em linguagem acessível e simples para entendimento do paciente que subscreverá o
"documento", ou de seu representante legal.”.
Na mesma direção
vemos o CDC – Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078, de 11 de setembro de
1990), em seu Capítulo III, DOS DIREITOS BÁSICOS DO CONSUMIDOR, que determina em
seu artigo 6º: “São direitos básicos do consumidor: (...)
III – a informação adequada e
clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de
quantidade, características, composição, qualidade e preço, bem como sobre os
riscos que apresentem;”.
Continua no mesmo sentido, o CDC, também no Capítulo V, DAS PRÁTICAS COMERCIAIS,
Seção II, DA OFERTA, no artigo 31, verbis: “A
oferta e a apresentação de produtos ou serviços devem assegurar informações
corretas, claras, precisas, ostensivas e em língua portuguesa sobre suas
características, qualidades, quantidade, composição, preço, garantia, prazos de
validade e origem, entre outros dados, bem como sobre os riscos que
apresentem à saúde e segurança dos consumidores.”,
trazendo para a relação de consumo a obrigatoriedade do dever do médico de
informar, e bem, ao paciente sobre os procedimentos em Cirurgia Plástica.
Todos os aspectos da relação entre
o médico e o paciente que regem, via de regra, este relacionamento na atividade
em todos os campos da Medicina, também regulam o atendimento médico em Cirurgia
Plástica. Mas, a Cirurgia Plástica Estética – embelezadora, apresenta como
característica, referendada pelo STJ – Superior Tribunal de Justiça, que assim
tem decidido, seguindo corrente doutrinária majoritária (existem vozes em
contrário), ser uma obrigação de resultado (e não uma obrigação de meios, como
sói acontecer no exercício da Medicina em geral) o objeto da relação contratual
que se estabelece, nestes casos, entre o cirurgião plástico e seu paciente.
NERI TADEU CAMARA SOUZA Índice
Artigos
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Erro Médico e Cirurgia Plástica
A Cirurgia Plástica tem grande
atividade no Brasil. Inclusive, estrangeiros vêm ao Brasil para realizar
procedimentos nesta área da Medicina. A maior reivindicação de seus direitos por
parte do cidadão brasileiro, a par de verem estes, em algumas ocasiões,
frustradas as suas expectativas
ADVOGADO E MÉDICO – DIREITO MÉDICO
Rua Upamaroti, 649 - Porto Alegre – RS - CEP 90820-140
Telefone: 0xx51.3247.2530/3247.2572
e-mail: resp@via-rs.net
Autor do livro: RESPONSABILIDADE CIVIL E PENAL DO MÉDICO – 2003 – LZN Editora –
Campinas – SP – Telefone: 0 xx 19.3213.7647
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http://lattes.cnpq.br/3546952790908357
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